segunda-feira, fevereiro 13, 2012

Simbiose

Nada mais se movia além do tempo e só se ouvia o som do vento batendo no seu rosto, fazendo o seu cabelo se movimentar como se dançasse um minucioso balé.

Estava sentada na varanda e de onde ela estava podia ver a sombra da lua no pequeno lago, por fora tudo era silêncio, mas dentro dela, porém tudo era uma convulsão de sensações, olhou ao seu redor, se lembrou de que há muito tempo atrás desejou passar a vida assim; sentada na sua pequena varanda, observando o seu pequeno lago e hoje afinal sentia que pra ela já era tarde demais, já estava há muito tempo sozinha longe do que as pessoas costumam chamar de civilização e ela ironicamente chamava de inferno.

Ela tinha razão, hoje já era tarde demais pra voltar atrás, longos anos se passaram desde que ela tomara essa decisão, optou por ela, deixando pra trás tudo o que a consumia, mas hoje sem saber por que seus fantasmas voltarão a lhe assombrar.

Passou a tarde contristada, revirando baús, retirando a poeira que se acumulara sobre ela ao longo dos anos, olhou pro céu a lua se distanciara e agora o que se via era um céu negro, achegou o xale pra junto do seu corpo fazendo um pequeno volume perto do peito, ficou segurando as pontas com força até seus dedos doerem, o vento estava ficando mais forte, logo choveria, mas ela não estava disposta a se levantar da sua varanda, nunca teve medo de chuva, ao contrário, gostava do som das gotas quando batiam no seu rosto, depois bastava um chá bem quente e tudo estava resolvido, a chuva nunca lhe deixara resquícios ruins, muito ao contrário, suas cicatrizes anunciavam a chuva e ela sempre se preparava e ficava lá sentada esperando.

Se deu conta de que nunca perdera uma lágrima sequer, mesmo as secas, sempre as achou necessária, sempre ansiou todas as lágrimas do mundo, mesmo as que não eram dela, por isso gostava de dias chuvosos, tinha a ilusão que aquelas eram as lágrimas do mundo.

Nunca soube ser impar, sempre gostou de números pares. Pensava que existia beleza em ser um, mas sem ser par não se consegue.
Já fora par muitas vezes, mas quando enfim chegava a hora de ser impar tudo ruía.

Ela olha a sua volta, a casa está vazia, ela mesma está vazia e nesse mesmo minuto as primeiras gotas de chuva caíram suaves no seu rosto, fechou os olhos por alguns segundos, segundos que duraram tempo demais, quando retrogradou a abri-los a chuva já tomara conta de tudo, olhou a grama verde e ela lhe convidava a dançar, se livrou dos sapatos e do xale e foi em direção a ela, tocou o chão com delicadeza sentiu nos seus pés a grama molhada, sentiu a textura fluida da grama misturada a chuva, sendo enfim impar fechou os olhos e dançou, mas agora não mais sozinha, tinha como companhia o céu negro e já sem estrelas.

Nada mais a prendia, se sentia suspensa, aos poucos sentiu que todas as convulsões haviam cessado e mais uma vez se tornara dona de si.

Experimentava naquele minuto uma ânsia avassaladora em se atirar ao chão e assim o fez, seu corpo estava exausto da dança, tudo o que ela sentia era a viscidez da grama misturada as suas lágrimas, logo seu corpo estava todo molhado e dela parecia jorrar toda a água do mundo, a única coisa quente eram as lágrimas que corriam sem pudores no seu rosto indo de encontro a chuva.
Suspirou fundo, secou os olhos, mas se deu conta de que não seria tão fácil, pois teve a confirmação que dali vertiam as lágrimas do mundo e só nesse pequeno instante se sentiu feliz, aquelas eram sim! As lágrimas mais doces que ela já havia chorado. Então teve certeza naquele momento que tomara a decisão certa.