sexta-feira, outubro 29, 2010

Beatrice


Beatrice tinha uma risada escandalosa, quase infantil, sorria sempre com o mesmo despudor de uma criança travessa o que lhe conferia certo charme.

Se conheceram em um Concerto de música, sentaram na mesma fileira e entreolharam-se, ela pensou que seria perfeito se não tivesse um jovem rapaz sentado entre eles.
Trocaram olhares cúmplices e em silêncio, ele não conseguia tirar os olhos dela e ela por vezes ruborizava e desviava os olhos, ora abaixando a cabeça, ora ficando incomodada e levando a mão á nuca como se assim fosse possível escapar daqueles olhos.

Ficaram assim durante quase toda a apresentação, ao findar se encontraram no saguão do teatro e o silêncio foi ensurdecedor.

Fizeram uma longa pausa, ele então se apresentou, depois de uma breve conversa saíram dali para um bar, onde beberam vinho e conversaram por horas a fio.

Ele olhava pra ela e só conseguia pensar que tudo nela inspirava sexo, a maneira como levava à taça de vinho a boca, como ajeitava o cabelo e principalmente como não conseguia manter-se quieta um segundo sequer.

Ele estava maravilhado e mais uma vez se deu conta de que não conseguia tirar os olhos dela, eles tinham um brilho incomum e ele conseguia sentir no ar os seus odores e suas nuances.

Ela recém formada em música, ele um poeta decadente beirando os quarenta anos. No decorrer da noite ele lhe contou sobre sua recém viagem a Índia, ele se expressava tão bem e as suas lembranças eram tão vividamente fortes que ela pode sentir todos os aromas e intuir todas as suas paragens. E então seu pensamento a traiu e ela desejou estar a sós com ele, mais como pensamentos são traiçoeiros e irresponsáveis e ela não era o tipo de mulher dada a pudores, muito ao contrário ainda mais depois de duas garrafas de vinho e de ter ouvido todas as suas histórias resolveu convidá-lo para ir até o seu apartamento, ele de pronto aceitou.

Beatrice á muito tempo havia decidido que nunca deixaria nenhum homem se aproximar o suficiente para ser perigoso e com ele não seria diferente.
Ela morava em um apartamento pequeno, mas de extremo bom gosto, ela dividia o espaço com sua gata persa e seus muitos livros, esses ocupavam quase o apartamento inteiro.

Ela nunca se dispunha a ir á casa de homem algum, preferia que eles fossem até a sua, odiava acordar cedo ou ter que sair no meio da noite e sem contar que ela achava bem mais prático não ter que servir o café da manhã, tendo em vista que ela jamais permitia quê nenhum deles dormisse por lá.

Sexo era sexo e sono pra ela era sagrada, repetia sempre como se fosse um mantra : Cama você divide com qualquer homem, sono não!

Acariciou a gata que veio ao seu encontro na porta da cozinha e abriu mais uma garrafa de vinho safra Uruguaia que era sua preferida. Ajustou a luz para que o ambiente ficasse tão entorpecente quanto o vinho, se livrou do salto alto e se sentou na poltrona de frente para ele.

Soltou os cabelos e a meia luz da sala foi de encontro as suas madeixas ruivas iluminando de um reflexo vermelho voraz todo o ambiente. Ele a observava como se quisesse perpetuar aquele momento para que mais tarde pudesse contá-lo á sua próxima conquista e ela sabia disso, tanto sabia que o fato a excitava ainda mais. Para ela não existia nada mais divertido do que entrar no jogo do outro e jogar sem que ele o saiba.

Beatrice sempre foi dada a joguinhos de prazer e não seria diferente com ele, afastou as pernas, arqueou os quadris, levou a mão por debaixo da saia e se desfez da calcinha, ele ficou atônito, aquele comportamento não condizia com a sua aparência frágil, tendo em vista que durante o concerto ela ruborizava cada vez que ele se punha a fitá-la um pouco mais de frente. Felizmente ele estava enganado.

Ele tentou falar algo, mais ela logo levou o dedo até o lábio pedindo silêncio.

Para ela ele seria um mero expectador naquele jogo e não o contrário, isso ela não admitia nunca.

Jogou a calcinha em sua direção, com a outra mão desabotoou o casaco e deixou um seio a mostra de onde ele estava sentado a sua pele parecia ainda mais branca e a pequena fresta de luz em sua direção era o suficiente para ele perceber que seus olhos ganharam um brilho lascivo. Ela mordiscou a parte inferior do lábio e pendeu a cabeça, enquanto uma mão amparava um dos seios à outra ia de encontro ao seu sexo.

Ele quis tocá-la, mas ela não permitiu, queria se lembrar dele assim, com os olhos cheios de desejo e fúria, ela então se livrou da saia para que ele tivesse uma visão completa da sua nudez, então se deu conta de que estava nua em pelo e um total desconhecido a observava sentado no seu sofá, obviamente isso a excitou ainda mais e ela só conseguia pensar que dele só sabia das histórias sobre sua estada na Índia e alguns poemas que ele fizera questão de declamar no decorrer da noite, pra ela isso bastava, sabia o que dele era mais intenso.

Ela então se levantou e foi até ele, beijou seus lábios com devoção, como se quisesse arrancar dele todo o desejo e fúria que virá estampado no seu olhar durante toda a noite. Num longo beijo levou a mão até o sexo e em seguida colocou os dedos entre os lábios dele para que pudesse sentir o seu cheiro e o seu gosto. Depois disso sentiu o seu hálito quente indo de encontro a sua nuca e lentamente se aproximando do seu sexo, sua saliva quente, seus lábios sutis rapidamente a sorveram com tamanha ânsia que toda a sutileza ficou para trás e deu espaço ao seu desespero, era como se nada pudesse aplacar o desejo misturado ao desespero de possuí-la.

Beatrice se contorcia e cravava as unhas em seus ombros cada vez com mais força, gemendo alto, arqueando ainda mais o quadril como se quisesse vê-lo dentro dela.
Lentamente seu corpo foi se acalmando, seus lábios se avolumando, emitiu um ultimo suspiro e se entregou a fúria do desejo dele e gozou logo em seguida.
Permaneceu inerte por alguns segundos como se nada além do seu sexo pulsasse, levantou levemente os olhos e o viu ali prostrado a seus pés, com a cabeça amparada em suas coxas.
Voltou para a mesma posição de inércia, gostou do que viu. Era exatamente assim que ela o queria desde que havia colocado os olhos sobre ele naquele concerto, mais isso ele jamais saberia.

quarta-feira, outubro 27, 2010

Sua


Nós temos medo de nós dois, carinho, meu rapaz! Meu homem que eu levo a sério com discrição e despudor, minha criatura mantida em amor por mim sob os olhos atentos da minha alma mais limpinha triturada e provocada pelo meu lado mais sujo. Você se deixa queimar, ou esse fogo só arde sobre mim?

Não quero investigar estrelas, eu quero a proximidade da tua pele na minha.

Eu quero o êxtase. Eu quero queimar sempre, mas eu sinto que a palavra precisa de voz. Só escrevo por isso, porque a palavra sem voz é uma palavra vã. Eu preciso da voz, antes a entonação que a métrica. A métrica da linguagem é o corpo e como ele se revela. Não existe simetria, só existe cheiro e tato. Eu tateio estrelas, eu busco o impossível, eu busco a beleza entre os destroços, eu busco uma centelha, eu busco o ar, eu busco esse rastro de beleza onde o olho humano não vê. A beleza de cada ser, a beleza nos olhos. Eu busco o que está perdido nos baús empoeirados de angústia e dor, eu busco beleza na angústia, eu busco um sopro de poesia onde tudo é dor. Onde está a sua beleza? Por que tantos questionamentos? A filosofia se perdeu com a modernidade e nem temos grandes causas, mas isso só se questiona quando se vive, e então eu me pergunto: Você está vivo?

 Quem cuidará das tuas chagas, quem colocará os dedos nas tuas feridas sem que elas causem repulsa a outrem? 

Não se iluda meu jovem, você nunca esteve em uma guerra de verdade, brinca com as tuas guerras particulares, você nunca teve vontade de morrer por alguém e a tua pele agora me parece fria e já sem vida, mas eu ainda vejo beleza nos teus olhos e as tuas mãos ainda pulsam.

Não jures amor em vão e nem tão pouco faça pouco do amor que te oferecem, não queira perpetuar a tua boca em mim, guarde a tua saliva, ainda vais precisar dela. Quem é você?  E como é que ousas ficar longe de mim? Como é que se resguarda você um homem  simbólico do meu alfa beta puta que pariu,  que eu vejo longe demais e que vai continuar assim; Ouviu! Entenda que eu não vou deixar você mandar aqui, sou jovem demais pra sua visão arcaica e moralista da paixão mundana do amor, viciada do sexo que você respeita e deturpa demais e que não sabe levar ao leo e nem dar tempo ao tempo. Sou velha demais porque construí uma pele renovada e que você quer lambuzar pela primeira vez.

  E mais uma vez eu pergunto: 
Quem você vai amar dessa vez! 
Mais uma bastarda? 
 Não, uma parte de mim.
Mais uma puta?   
 Não, uma parte dos meus personagens.

 E eu tenho que te amar como eu sou  e isso me irrita e me enoja em ti porque eu te amo erradamente,  corriqueiramente todos os dias sem detestá-lo.

Porque ousa você me instigar e me provocar com as tuas tentativas patéticas que não quero negar a ninguém, muito menos a ti, e que nego a ti por pensares quem sou.
Depois vem e diz que não conquistou nada,  mesquinho, mentiroso e inóspito você que joga e manipula dados e peões, vacas e rainhas, todas as mulheres te repugnam e querem dar pra você e finges que não vê. Finges que é esfinge. Finge superioridade quando só é superior, quem ri de ti ou goza do melhor que tens a dar a outrem e o que não dá?

 O que fazer contigo em mim? Você, um labirinto incauto em história de uma vida em televisão e realidades nuas sutilmente cozinhadas em fantasias que estimulará em mim todas as noites com o seu gosto de cinema na língua. ÉS tudo e ÉS nada rapaz, não viveu nada e tem sede de tudo, tem pressa de um tempo medíocre que não sabe o que foi nem o que eu vejo dele hoje, mira-me errada como ÉS e não me vê como sou.  Não me vê mulher , mas fêmea, tentar prurir em mim uma função na tua vida que não tenho e nem terei, anuncia ao seu Deus e ao mundo que ÉS como eu e que fará bem a mim dando de ti a mim o mundo. 
Tenho medo do que vou sentir depois que dar pra você e olhar a tua cara satisfeita, refeita de feliz, como seria você feliz? Seu carinho fingido, seu gozo mentido, seu cuspe envernizado no seu corpo que cheira a suor e  sabão caro e duro, rudimentar demais.

Você que não estava vivo quando comprei o meu primeiro perfume que não era meu, quando eu por um tempo deixei  de usá-lo por causa de homens como você.
Tenho medo de olhar pra ti depois de dar- te a mim e saber que seus clichês são tão previsíveis. Foi bom pra nós dois e se foi  você vai me fazer sobrar o quê pra querer? Se posso querer coisa melhor, se tenho coisa melhor ao estalar uma ponta do meu dedinho aos ecos do castelo e da sarjeta. 

Você nunca foi à guerra, fugiu da escola e do exército da nossa pátria amada, mas foges da mulher amada, vai até ela quando quer, trabalha quando quer. Não tem compromisso e nem assina cheques, você nunca matou um homem nunca fez uma mulher se matar, nunca atirou uma pedra ao precipício e invade o meu território com cem mil soldados, todos buscando a minha aprovação como se eu fosse mulher que desse aprovação a algum homem que precisasse de mim todas as noites.Você que teve a minha aprovação tantas vezes, logo terá a ousadia de dedilhar-me e ainda assim ouvir o meu simples sim? 

ÉS tolo o sim, eu guardo para os outros, eu rio do sim, ele é que me faz gozar. Eu levo a sério o não que nunca soubestes me dizer, preciso de mais, você não vai me ter, você não vai me prender e se me tiver provavelmente não vai me querer por tempo além do seu próximo projeto de desenho, você que não sabe os seus desejos que delineia desejos com projetos de mulheres e projeções do seu inconsciente bárbaro, canalha, leal, amigo, amante que não sabe amar e se fez ser amado uma única vez na vida por mim. 
E se eu não quero o mundo? E se eu só quero de ti o seu mundo e a mim, e  pensa na cama, vê se suja bem a sua cama perfumada se é pra ser feliz com o teu deboche e lágrima de amor.
Da sua...

Taci Galdino .
Sebastião Maciel.